«Onde estão os outros nove?»
São muitas as pessoas que
rezam, mas depois não as vemos a voltar atrás para dar graças a Deus [...] «Não
foram dez os que ficaram curados? Onde estão os outros nove?» Recordar-vos-eis
de que foi nestes termos que o Salvador Se lamentou da ingratidão dos outros
nove leprosos. Eles sabiam rezar, suplicar e pedir, pois tinham levantado a voz
para exclamar: «Jesus, Mestre, tem compaixão de nós!» Mas faltou-lhes uma
coisa, a que o apóstolo Paulo chama «a ação de graças» (1Tim 2,1): não voltaram
para dar graças a Deus.
Nos nossos dias, ainda é
frequente vermos muitas pessoas pedirem a Deus com insistência o que lhes
falta, mas são poucas as que se mostram reconhecidas pelos dons recebidos. Não
é mau pedir com insistência, mas o que faz com que Deus não nos atenda é a
nossa falta de gratidão. E talvez seja até um ato de clemência da sua parte
recusar aos ingratos o que estes pedem, para que não venham a ser julgados com
rigor por causa da sua ingratidão [...]. É pois por misericórdia que Deus retém
por vezes a sua misericórdia. [...]
Vede como tantos dos que
foram curados da lepra do mundo, isto é, de desordens evidentes, não aproveitam
a sua cura. Alguns, com efeito, foram atingidos por uma chaga bem pior do que a
lepra, tanto mais perigosa por ser uma chaga mais interior. É por isso com
razão que o Senhor do mundo pergunta onde estão os outros nove leprosos, porque
os pecadores se afastam da salvação. E foi por isso que, depois de o primeiro
homem ter pecado, Deus lhe perguntou: «Onde estás?» (Gn 3,9).
São Bernardo (1091-1153), monge
cisterciense, doutor da Igreja | Sermões diversos, n.º 27